sábado, setembro 28, 2019

As Árvores II


As Árvores II
Outro fato que me impressiona sobre as árvores é como elas mudam ao longo das estações. E como elas são lindas de todas as formas. Por que nem sempre me sinto assim com minhas mudanças?
Acho engraçado como aqui as estações não definem todas as árvores. Na primavera também tem muitas folhas secas, que se quebram até virarem poeira e voarem em nossos olhos.
Também me impressiono com as árvores que, mesmo doentes – ou até mesmo mortas -, continuam de pé. Há quem diga que isso é resiliência. Acho que elas só não perceberam seu próprio estado. Talvez isso seja bom, ainda tem muita vida na doença e na morte.

Rio de Janeiro, 18 de setembro de 2019

segunda-feira, setembro 02, 2019

A Chuva



Quando era criança, lembro-me de pisar numa poça num dia de chuva, apenas por curiosidade. Descobri que os pés se encharcam, sensação não muito agradável ao meu ver.
Quando era adolescente, não gostava de usar guarda-chuva. Talvez não fosse questão de gosto, mas sim de estar habituada a não usar, já que no meu colégio não nos era permitido. Mas lembro de gostar de sentir as gotas caindo em meu rosto, escorrendo pela testa. Algumas eram contidas pelas sobrancelhas, outras chegavam aos meus olhos. Eu me sentia viva, como quando minhas mãos ardiam numa manhã fria em que eu teimava em não me agasalhar.
Os dias de chuva passaram a ser ansiosamente aguardados quando vivi meu primeiro amor. Dividíamos um guarda-chuva minúsculo, o que fazia com que ficássemos emboladas pelo caminho num abraço gostoso. E o chapéu do guarda-chuva era para mim uma proteção do mundo lá fora tão difícil. Naquele momento, éramos eu, ela, a chuva e o nosso abraço.
Depois de um tempo, a chuva passou a me deprimir. Odiava sair de casa, só queria me deitar com minha tristeza. Mas depois de longos anos sofrendo com dias chuvosos, percebi que essa água que cai do céu não é tão ruim assim. Mais uma vez, o amor mudou algo em mim. Como me sentir triste com seu aconchego? Sua vontade em me fazer feliz principalmente quando chove?
Nem sempre fico feliz, principalmente com o trânsito e com as gotas que cismam em respingar em minhas pernas. É, mas acho que hoje eu entendo que o céu também precisa chorar, assim como eu. Talvez por isso eu odiava a chuva. Ela me lembrava dos choros não chorados por mim. E ela continuava a chorar os dela.
Rio de Janeiro, 02 de setembro de 2019 (I)
(meu quarto)

Paciente


Gosto da palavra “paciente” para quem me procura.
Ser paciente implica em ter paciência. E ter paciência consigo mesmo e com o processo de análise não é algo de grande importância?
Há quem diga que remete a estar doente. E não se está? Somos doentes de nossas neuroses, somos doentes de amor, somos doentes de compulsões, de vida, de morte.
Estar vivo não implica em ser doente?
O problema é que fugimos da doença. Fugimos tanto que às vezes... adoecemos (oi, restrição alimentar; oi, hipocondria, oi, medo de falhar tão grande que não se sai do lugar; oi,...).
Enxergar nossa doença implica uma possibilidade singular: a de escolher o que fazer com ela. É admitir que existe algo tão imperfeito em nós.
Isso não é ser humano?
Quanto ao cliente, bem... Desse termo eu não gosto. Acho que me sinto como um serviço. Que tem início, meio e fim. E tem?
Também não gosto muito de analisando. Como se a pessoa estivesse num experimento. A amostra está sendo analisada. Que coisa, não?
Chamem como quiserem, eu gosto é mesmo de ouvir. Ao invés de analista, deveriam me chamar de curiosa.
Rio de Janeiro, 28 de agosto de 2019
(no consultório)

A Porta



Não sei quando nem como cheguei. Mas lá estava eu, diante da casa amarela, de muro baixo e jardim bem cuidado. Abri o portão branco, com sua tinta levemente desgastada, e atravessei o jardim pelo caminho de pedras. Parei na varanda, diante da porta. Percebi que os móveis de metal cheios de curvas ornamentais estavam empoeirados.
Por um segundo, considerei me sentar numa das cadeiras duras, mas algo me impeliu a bater à porta de vidro distorcido. Ninguém atendeu. Não foi uma surpresa, sei que bati com muita leveza. Apenas duas vezes.
Não queria que me atendessem. Quis virar as costas e ir embora, pensando que ao menos eu havia tentado. Mas negociar comigo mesma na base da mentira era ultrajante.
Resolvi bater à porta com mais veemência. Cinco toques dessa vez. Nada.
“Certo”, pensei. “Talvez com um pouco mais de coragem”. Bati por mais tempo do que pensei que suportaria.
Movimento. Um vulto passou atrás da porta. Senti meus ombros se encolherem. Prendi minha respiração e fitei meus pés.
Nada. Um tempo doloroso demais se passou. Nada. Pensei em chamá-la, mas senti minha garganta se enrouquecendo ao puxar meu fôlego.
Bati ao vidro, ouvindo-o se chocar contra a estrutura metálica da porta. Vi o vulto passar novamente, mas dessa vez mais distante.
Nada. E nada.
Senti a raiva, a tristeza e a vergonha esquentarem minha face e minhas orelhas. Foi tão difícil vir aqui, tomar coragem de bater a essa porta tão dura. Mais duro ainda era não ser atendida. Não pela ausência de gente. Não fui atendida, porque... não! Pela ausência de vontade! Que crueldade!
Bati no vidro com a força da minha raiva, da minha mágoa. No começo, era por não ter sido atendida. Depois, por ter me feito passar por isso. Eu sabia que ela não me atenderia.
...
Sabia mesmo?
Se soubesse, não estaria aqui.
Rio de Janeiro, 02 de setembro de 2019 (III)
(Desafio)

domingo, agosto 18, 2019

Nome Composto



Esse negócio de nome composto é um tanto engraçado.
Nasci Ana Luiza. Quando me perguntavam meu nome, dizia-o com todas as letras. Hoje sou só Ana. Um ou outro me chama de Luiza. Acho estranho, não parece que sou eu. Mas parece que, nesse momento, esse do “Luiza” sozinho flutuando no ar, percebo essa parte que existe em mim que sempre me esqueço. Eu gosto dela, só esqueço mesmo. Ela é casada com a Ana.
Também sou Aninha. Por mais vezes do que espero. É o apelido carinhoso que diz muito sobre mim. Assim como Nee. Ele aponta aqueles que mais me conheciam na adolescência. E que ficaram.
Consigo contar nos dedos quem me chama pelo meu nome composto. Fico impressionada com o fôlego e a disposição.
Mas, afinal, esse nome é composto de quê?
Rio de Janeiro, 15 de agosto de 2019
(Uma volta para casa no 433)

O Preço de (Não) Ser


“O preço de não ser é caro.”
“O preço de não ser é caro?”
“É.”
“O de ser também é.”
Rio de Janeiro, 15 de agosto de 2019
(Diálogo de uma análise. E depois... O corte.)

Não-Tudo



Eu escrevo.
Escrevo sobre o meu nada.
Escrevo sobre meu tudo. Aquele tudo inalcançável, aquele tudo que escapa.
Aquele tudo que me move e me angustia.
Que tudo é esse?
Fico matutando todo esse tanto que não consigo explicar.
Precisa explicar?
(Não) decido agir. Depois fico olhando para meus atos com uma estranheza desconhecida: “ué, mas de onde veio isso?”. Não sei explicar. Não consigo explicar. Talvez seja por isso que gosto tanto de escre-ver. Para continuar encarando minha estranheza. Para assistir o deslizar da caneta que dança sozinha.
Mas confesso. Fico um tanto preocupada. Vai que esse tudo me inunda e me afoga? Antes eu me afogava no seco das não-palavras. Ou seria das palavras específicas?
Acho que prefiro essas palavras novas.
Talvez ainda sobre um pouco das antigas.
Não sei.
Rio de Janeiro, 13 de agosto de 2019
(Lojas Americanas em Copacabana)

domingo, agosto 04, 2019

A Pedra


A sensação que tenho é que eu cavava ferozmente em busca de uma relíquia. Mas me deparei com uma pedra gigantesca. Fico enfurecida, penso em abandonar a escavação. Penso no trabalho que terei até conseguir escavar essa enorme pedra. Mas e depois? O que fazer com essa maldita pedra? Não consigo movê-la sozinha. Devo quebrá-la? Ou só devo observá-la e ir embora?

Rio de Janeiro, 04 de agosto de 2019

Verbo ser e suas conjugações



Eu sou.
Eu sou isso.
Eu sou isso que não sou.
Sou aquilo que tento apreender rabiscando palavras no papel.
Mas quando as rabisco, aprisiono-as. Aprisiono-me. Vou a todos os lugares e a lugar algum.
Quando as rabisco, já não sou eu.
Mas, quando as rabisco, algo em mim acontece. Elas deslizam, elas cantam. E eu só vejo essa dança acontecer diante dos meus olhos curiosos.
Queria poder escrever todos os textos que existem em mim. Mas nunca consigo. A beleza e a peculiaridade deles ficam só para mim.
Soa um tento egoísta, mas mal sabe você a luta que é tentar capturar minhas palavras.
Fico em silêncio, permaneço imóvel para não afugentá-las. É como observar um animal selvagem e não poder tocá-lo. E não poder ser vista. É como ter a certeza de ter pescado um peixe com as mãos para depois perceber que nunca houve peixe. Apenas o encaixe quase que perfeito da água por tempo suficiente para enganar a mente.
Então por que escrever?
Talvez por achar que um dia serei.
Talvez por perceber que, embora não saiba, já sou.
Que a dança que observo faz parte de mim. Sou eu também.
Sou todas essas palavras e nenhuma delas.
Sou isso.
Sou isso que sou.
Sou.
Sou?

Rio de Janeiro, 03 e 04 de agosto de 2019

domingo, julho 28, 2019

Caminho de Casa



Antes eu me achava tão forte por não me deixar abalar.
Crise existencial? Angústia? Tristeza? Incerteza? Desejo? Nada disso me era permitido.
Apenas uma raiva constante, impaciência com tudo, insatisfação sei-lá-de-quê e uma fome insaciável.
Mal sabia eu que era fome da alma, fome de sentir tudo aquilo que, paradoxalmente, eu engolia.
Descobri-me mutilada, com um corpo terrivelmente ferido que eu não reconhecia como meu. De repente, me dei conta de que alguém lavava essas feridas e, com cada lavada, eu me tornava mais consciente daquele corpo estranho. Esse alguém era eu mesma, já um pouco menos ferida, mas com todas as cicatrizes presentes.
Eu, ela(s) e a água me diziam que agora sim eu podia entender o que era ser forte. Agora sim eu poderia achar o caminho de casa.
Mas esse caminho é meio esquisito. Uma hora faz um sol que arde com toda a força em minha pele. Outra, uma chuva gelada que me congela por inteiro.
Às vezes, há uma subida infinita aos céus. Outras vezes parece que caí de um precipício.
Ao percorrer esse caminho, fico imaginando como é a minha casa. Quando tenho a imagem finalmente clara em minha mente, ela some e volta se refazendo por inteiro.
Embora eu não saiba como é essa casa, sei que já posso chamar de minha. Sei que posso transformá-la sempre que quiser. Sei que talvez eu nunca chegue nela, pois na vida há tanto para ver.
Talvez eu me aconchegue sempre que me cansar e saia quando quiser. E a leve para onde for. O que antes era uma prisão, hoje já é mais como um lar.

Rio de Janeiro, 27 de julho de 2019

quarta-feira, julho 24, 2019

Saudade


Sinto sua falta.
Sinto falta de segurar sua mão, sinto falta do seu abraço, do seu colo.
Sinto falta do seu cheiro. Não só do seu perfume, mas daquele cheiro inexplicavelmente refrescante e doce da sua respiração.
Sinto falta do seu café e de você sempre me oferecer o que tem mais espuma, porque você sabe que a amo.
Sinto falta da sua bagunça e de brigar com você enquanto arrumo tudo.
Sinto falta de conversar sobre nada e sobre tudo.
Que saudade de você cantando “Bumbum Granada”. Sua vitalidade a transforma em poesia, por mais estranho que isso possa parecer.
Que saudade de escolher a programação do final de semana.
Que saudade de uma noite fria com o céu estrelado em Teresópolis.
Que saudade desse abraço que nunca chega...
______
Antes eu te escolhia por ser a coisa lógica: como não escolher um amor tão fácil e leve?
Hoje te escolho de outra forma: quero compartilhar minha viagem em mim mesma com você. Por mais que às vezes não queira sua presença tanto assim.
Quero poder te escolher todos os dias. Cada dia um motivo. Mas o melhor deles é o amor.


~meueuempapel, 24 de julho de 2019

Sou eu comigo mesma mesmo?



Talvez quando eu diga “sou eu comigo mesma” não esteja sendo muito verdadeira.
Talvez o meu eu comigo mesma seja, na verdade, eu com você.
Sou eu me expondo para você o tempo todo, até em pensamento.
Esse desnude constante faz com que eu me sinta incrivelmente vulnerável. Sou eu te mostrando todas as minhas feridas abertas num tom de súplica por seu aconchego.
O aconchego desejado é bem diferente do real. Ele vem através da sua voz doce e serena.
Ainda que às vezes ela oscile num tom mais violento, agradeço o tapa sincero. E ainda assim desejo seu colo.
Que nunca virá.
~meueuempapel, 19 de julho de 2019

A Dança


A música começa. Ah, essa música...
Tomo coragem e vou até você, na esperança de que queira dançar.
Sem trocarmos uma palavra, você me dá a mão e me leva para o meio da pista.
Sem uma só palavra, há a possibilidade de todas elas. E é nessa possibilidade que quero morar.
Nossos corpos se conectam por um magnetismo inexplicável...
São seus olhos... Sua pele... Seu cheiro... Seu cabelo...
Seus lábios não beijados criam esse mistério infinito.
Se por um lado quero solucioná-lo, por outro quero morar nele para sempre. Essa tensão por não saber se a realidade corresponde com a expectativa já é suficiente.
...
Será mesmo suficiente?
Antes que eu possa me decidir, a música acaba, e me vejo sozinha novamente. Na eterna espera do impossível.

~ meueuempapel, 19 de julho de 2019

terça-feira, julho 16, 2019

A Grande Aventura



Olho para o papel em branco e me pergunto:
“O que escrever?”
Estou inundada de sentimentos e sensações, mas não consigo formulá-los. Mas a vontade de sentir a caneta riscar o papel e me ver tomando forma através das palavras me impelem a escrever.
A sensação que tenho é de que estou numa grande aventura. Num lugar de terra batida, sol quente ardendo em minha pele, e eu escavando em busca de um artefato precioso.
Às vezes sou eu comigo mesma explorando essa terra vermelha. Às vezes me vejo cercada de ajudantes, que estão tão empolgados quanto eu.
Às vezes estou tão compelida a encontrar o artefato que cavo sem parar usando a maior pá que consigo carregar. Mas a frustração por não achar nada e o medo de danificar o encoberto com minha avidez me fazem trocar a pá por um pequeno pincel. Varro o chão seco cuidadosamente.
Acho que vi alguma coisa! Sim! Um objeto brilhante!
Com cuidado, escavo ao redor do brilho para retirá-lo da terra vermelha.
É um espelho.
Viro-o para me olhar. Por um segundo, vejo o reflexo de uma Ana cansada, coberta de poeira da terra. Mas o reflexo se transforma em uma pessoa que nunca havia visto. Ou talvez já tenha, mas não me lembro.
E o reflexo continua se transformando em uma série de pessoas (des)conhecidas.
Um misto de familiaridade com o inexplorado.
Quem são essas pessoas?
Sinto que sou elas. Mas elas... não são eu.
Volto a escavar com minha caneta e meu papel, na esperança de achar a palavra mais preciosa: eu.



~ meueuempapel, 16 de julho de 2019

segunda-feira, julho 15, 2019

Andar de Bicicleta



Dizem que não se esquece como andar de bicicleta.
Mas quem já deixou de andar por um tempo sabe como é estranho voltar.
É assim que me sinto com minha tristeza.
Se antes ela era tão presente e depois tão suprimida, estou reaprendendo a senti-la.
“Você precisa aprender a ser feliz”. Existe como aprender a ser triste?

~ meueuempapel, 09 de julho de 2019

A Analista


Dá-me a mão para que eu possa caminhar.
Arriscando-me
No meu pequeno grande universo
Inconsciente.
Eu tento em vão colocar barreiras na esperança que não
Leia meus pensamentos. Mas
Lá vem você com
Essa voz que me indaga e me

Liberta de mim mesma. O que antes era
Insuportável, hoje já é
Mais possível. Essa
Análise tão difícil se faz pela via do amor.

~meueuempapel, 05 e 09 de julho de 2019

Cansei


Cansei.
Cansei de lutar contra mim.
E, embora meu corpo proteste imensamente pela batalha a ser perdida, cansei de lutar contra você.
A verdade é que não existe você. Sou eu contra mim mesma há mais tempo do que posso me dar conta.
Reluto comigo mesma o tempo todo.
Mas essa reluta constante me imobiliza.
A ponto de perder as palavras, tão importantes para mim.
A ponto de me anestesiar diante da minha dor.
A ponto de me afogar sem nem me dar conta.
O desejo pela clínica me salvou de mim mesma.
E a vida ia passando...
Mas agora tudo vem à tona.
E, embora seja quase insuportável lidar com essa angústia, cá estou eu.
Eu, comigo mesma. Chega de batalhas.

~meueuempapel, 09 de julho de 2019

quarta-feira, julho 03, 2019

A Cela

Tive um sonho estranho. Um sonho ruim.
Ah, esses sonhos... Despertam tanto em mim...
Não é fácil tentar achar um sentido para eles.
Não porque não sei o que pensar. Mas sim porque dói.
Tem muita coisa entalada ainda. Muito a dizer.
Muitas vezes me pego a ponto de chorar. Mas não me permito.
Tento compensar a tristeza com a raiva.
Deveria estar só triste, mas não suporto minha tristeza.
Pensando bem, a raiva (também) é de mim mesma.
Como é que cheguei a esse ponto?
O medo de ficar vulnerável, o medo de me expor, o medo de não ser amada...
Tantos medos me fizeram prisioneira de mim mesma.
Vou até mim, abro a cela. Mas não me reconheço.
Talvez depois de um tempo isso seja possível.
É, às vezes eu consigo me enxergar em meu olhar. Vejo por uma fração de segundo todas as Anas ao longo desses 26 anos. Não me sinto exatamente como nenhuma delas, mas ao mesmo tempo me sinto como todas.
Todas são eu. E sou todas elas.

segunda-feira, julho 01, 2019

"Existe mulher que não sofre?"


Que mundo é esse em que vivemos em sofrimento?
Sofremos com nossos corpos que nunca atingem o padrão inalcançável Ou com o rótulo de “exibidas” se gostarmos do que somos.
Sofremos com as conseqüências biológicas de simplesmente sermos mulheres. As malditas dores que nos deixam vulneráveis, mas que não são desculpa para não nos arrumarmos e fingirmos que está tudo bem, quando, na verdade, só queríamos deitar na cama quentinha e esquecer do mundo lá fora.
Sofremos com nosso desejo. Se queremos demais, somos putas. Se queremos de menos, somos frígidas.
Querer uma mulher?
Querer uma mulher e um homem? Pior ainda.
Sofremos pela rivalidade feminina nos ensinada desde o berço.
Sofremos com nosso silêncio. Mas se ousamos falar, “pra que tudo isso?”.
Sofremos com o silêncio dos homens, que no alto de seus privilégios nada fazem por nós.
Sofremos ao sermos mães. E com a busca em ser a mãe perfeita.
A esposa perfeita.
A amante perfeita.
A profissional perfeita.
...
A mulher perfeita.

Nossas feridas são motivo de orgulho, como se, de alguma forma, elas representassem medalhas por nossas vitórias diárias.
Mas as medalhas de verdade nunca vêm. E nunca virão. E eu queria não precisar de medalha alguma.
Somos fortes, porque precisamos ser. Não é bem uma escolha. Ganhar mérito por isso chega a ser um tanto... perverso.

Mas ser mulher tem lá suas vantagens. O enigma abre espaço para moldarmos quem queremos ser. E que delícia poder escolher.

A Minha Verdade

(31/06/2019)

Já faz muito tempo que me calo em pensamento.
Sou inundada pela raiva e mágoa por todas as vezes que me feriram sem saberem.
Um comentário inocente na verdade era um disfarce para o ódio gratuito. E que eu, na minha esperança em ser aceita, engoli em seco todas as vezes. Dizia para mim mesma que era preciso respeitar o pensamento antiquado das gerações passadas.
Hoje, abro a porta e convido-os a se retirarem, pois a minha verdade vale mais.
A verdade é que o colo que desejo é feminino.
O perfume preferido é feminino.
A voz que me acalma é feminina.
O corpo que me aquece é feminino.
Quero poder falar de amor sem censurar o meu desejo.
Quero fazer planos sem ter medo.
Quero suspirar quando penso nela sem podar o meu amor.
Quero fantasiar sem minha auto-reprovação.
Quero terminar esse texto sem culpa.
Culpa por ser diferente.
Culpa por não me encaixar.
Culpa, principalmente, por não conseguir me libertar.
Depois de tanto tempo, ainda dói.