segunda-feira, setembro 02, 2019

A Chuva



Quando era criança, lembro-me de pisar numa poça num dia de chuva, apenas por curiosidade. Descobri que os pés se encharcam, sensação não muito agradável ao meu ver.
Quando era adolescente, não gostava de usar guarda-chuva. Talvez não fosse questão de gosto, mas sim de estar habituada a não usar, já que no meu colégio não nos era permitido. Mas lembro de gostar de sentir as gotas caindo em meu rosto, escorrendo pela testa. Algumas eram contidas pelas sobrancelhas, outras chegavam aos meus olhos. Eu me sentia viva, como quando minhas mãos ardiam numa manhã fria em que eu teimava em não me agasalhar.
Os dias de chuva passaram a ser ansiosamente aguardados quando vivi meu primeiro amor. Dividíamos um guarda-chuva minúsculo, o que fazia com que ficássemos emboladas pelo caminho num abraço gostoso. E o chapéu do guarda-chuva era para mim uma proteção do mundo lá fora tão difícil. Naquele momento, éramos eu, ela, a chuva e o nosso abraço.
Depois de um tempo, a chuva passou a me deprimir. Odiava sair de casa, só queria me deitar com minha tristeza. Mas depois de longos anos sofrendo com dias chuvosos, percebi que essa água que cai do céu não é tão ruim assim. Mais uma vez, o amor mudou algo em mim. Como me sentir triste com seu aconchego? Sua vontade em me fazer feliz principalmente quando chove?
Nem sempre fico feliz, principalmente com o trânsito e com as gotas que cismam em respingar em minhas pernas. É, mas acho que hoje eu entendo que o céu também precisa chorar, assim como eu. Talvez por isso eu odiava a chuva. Ela me lembrava dos choros não chorados por mim. E ela continuava a chorar os dela.
Rio de Janeiro, 02 de setembro de 2019 (I)
(meu quarto)

Nenhum comentário: