segunda-feira, setembro 02, 2019

A Porta



Não sei quando nem como cheguei. Mas lá estava eu, diante da casa amarela, de muro baixo e jardim bem cuidado. Abri o portão branco, com sua tinta levemente desgastada, e atravessei o jardim pelo caminho de pedras. Parei na varanda, diante da porta. Percebi que os móveis de metal cheios de curvas ornamentais estavam empoeirados.
Por um segundo, considerei me sentar numa das cadeiras duras, mas algo me impeliu a bater à porta de vidro distorcido. Ninguém atendeu. Não foi uma surpresa, sei que bati com muita leveza. Apenas duas vezes.
Não queria que me atendessem. Quis virar as costas e ir embora, pensando que ao menos eu havia tentado. Mas negociar comigo mesma na base da mentira era ultrajante.
Resolvi bater à porta com mais veemência. Cinco toques dessa vez. Nada.
“Certo”, pensei. “Talvez com um pouco mais de coragem”. Bati por mais tempo do que pensei que suportaria.
Movimento. Um vulto passou atrás da porta. Senti meus ombros se encolherem. Prendi minha respiração e fitei meus pés.
Nada. Um tempo doloroso demais se passou. Nada. Pensei em chamá-la, mas senti minha garganta se enrouquecendo ao puxar meu fôlego.
Bati ao vidro, ouvindo-o se chocar contra a estrutura metálica da porta. Vi o vulto passar novamente, mas dessa vez mais distante.
Nada. E nada.
Senti a raiva, a tristeza e a vergonha esquentarem minha face e minhas orelhas. Foi tão difícil vir aqui, tomar coragem de bater a essa porta tão dura. Mais duro ainda era não ser atendida. Não pela ausência de gente. Não fui atendida, porque... não! Pela ausência de vontade! Que crueldade!
Bati no vidro com a força da minha raiva, da minha mágoa. No começo, era por não ter sido atendida. Depois, por ter me feito passar por isso. Eu sabia que ela não me atenderia.
...
Sabia mesmo?
Se soubesse, não estaria aqui.
Rio de Janeiro, 02 de setembro de 2019 (III)
(Desafio)

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